Passados cinco meses das eleições legislativas que puseram fim a uma maioria absoluta do partido socialista e deram a vitória à AD o que mudou no que respeita à agricultura e às florestas? Bem, agora que, justamente, tanto se fala de clima, mudou desde logo o clima político, a forma como os responsáveis políticos passaram a olhar para o sector, de um claro abandono para a reafirmação repetida do carácter estratégico da nossa agricultura e das nossas florestas e isto tanto a nível dos responsáveis sectoriais como, mais importante, do próprio Primeiro-Ministro.

As palavras têm significado, mesmo quando ditas para agradar às plateias elas acabam por fazer o seu percurso, levam agentes intermédios a refletir, a adaptar as suas condutas à voz do chefe, impõem uma renovada atenção à resolução de problemas. São, portanto, positivas em si mesmas. E já agora pergunto-me se os novos responsáveis socialistas não estarão arrependidos do abandono a que o seu partido votou o sector, se terão já feito as contas e se não terão concluído que foi também o mundo rural que lhes fez perder as eleições. Veja-se a diferença de votos entre a AD e o PS, calcule-se o peso do mundo rural e tirem-se as conclusões.

Mas por muito importantes que sejam as palavras, elas não chegam. Se parece certo que o Ministério da Agricultura recuperou algum do seu peso político, de que é indício a resolução do Conselho de Ministros do passado dia 8 de agosto, se é verdade que a promessa eleitoral do regresso das florestas ao Ministério da Agricultura, de onde nunca deveriam ter saído, foi cumprida logo na formação do Governo, se o novo Ministro tem feito um esforço que se reconhece de aproximação pessoal aos agricultores e produtores florestais procurando escutá-los e compreendê-los, a verdade é que muitíssimo continua por fazer. A resolução do Conselho de Ministros, de difícil interpretação, abre caminho ao cumprimento do acordado em sede de Concertação Social no já longínquo mês de outubro de 2023- o célebre artigo 36 do Acordo, exigência sine qua non da CAP para assinar o acordo e que prevê um substancial reforço nos apoios aos agricultores e produtores florestais- mas continuam no éter as novas medidas agroambientais que ali especificamente ficaram previstas e pelas quais a CAP se bateu; só com as novas medidas e com o apoio que elas darão, nomeadamente à pecuária extensiva, se poderá com verdade dizer que o Acordo estará cumprido. Está inteiramente nas mãos do Governo incluir estas novas medidas agroambientais na reprogramação do PEPAC a apresentar rapidamente em Bruxelas, uma vez que a CAP elaborou e fez chegar ao Governo logo em abril as suas propostas concretas nesta matéria.

Também em matéria de água não posso deixar de manifestar preocupação. O Governo criou uma equipa para levar em frente o projeto ‘Água que nos une’, iniciativa em si mesma muito positiva mas que nasceu desde logo inquinada pela ausência de qualquer elemento exterior às estruturas do Estado. Será que ainda não percebemos a vantagem em integrar nestas iniciativas o sector privado? Não como um parceiro menor, ao qual eventualmente se faz o favor de escutar, mas como um elemento estruturante essencial, pelo conhecimento que tem do terreno e dos seus próprios projetos. Continuamos a aguardar o convite para sermos ouvidos na matéria.

Se todas estas questões no plano legislativo e dos projetos levantam interrogações, mais preocupante é a continuada impossibilidade de o Ministério da Agricultura chegar na prática ao terreno. O Ministério, que o partido socialista procurou desmembrar e eventualmente fundir, continua amputado dos seus braços no terreno que são as Direções Regionais. Vítima por arrastamento de um projeto de regionalização encapotada, que contraditoriamente centralizou nas CCDRs o que estava descentralizado, e no qual a agricultura foi sempre, na melhor das hipóteses, vista como um parceiro menor, o Ministério pode hoje legislar, pode negociar em Bruxelas o que entender, não pode nem garantir o cumprimento da Política Agrícola COMUM nem apoiar os agricultores e produtores florestais. Mais, responsável perante Bruxelas pela execução das verbas comunitárias e, portanto, em última análise responsável pela devolução de verbas incorretamente aplicadas, o IFAP não tem autoridade para no Ministério da Agricultura dar instruções àquelas direções regionais. Nada disto faz qualquer sentido, como muito bem reconheceu atempadamente o Primeiro-Ministro ao prometer logo na campanha eleitoral a reintegração destas Direções Regionais no Ministério da Agricultura.

Entendamo-nos: o que os agricultores e produtores florestais exigem é a recuperação da capacidade do Ministério da Agricultura de os apoiar, de os escutar e de executar diretamente no terreno a política agrícola. O Ministro da Agricultura e Florestas tem de ter a possibilidade de dar instruções diretas e verticais aos seus funcionários Diretores Regionais e estes têm de ter a capacidade e os meios para através dos respetivos serviços fazerem chegar ao terreno aquelas instruções.

Nada mais nos interessa, os agricultores não querem saber de guerras de, ou entre estruturas do poder local e, pelo contrário, entendem que a visão do interesse nacional deve levar a uma colaboração entre os diversos sectores, a uma participação da agricultura lado a lado com a indústria, o comércio, o turismo, etc., numa visão abrangente do território. Estaremos sempre dispostos a participar nesta visão integrada, mas não desistiremos de um Ministério da Agricultura forte e presente diretamente no terreno, condição indispensável à correta aplicação da política agrícola comum e ao desenvolvimento da nossa agricultura e das nossas florestas. Que não haja qualquer dúvida, não desistiremos até esta promessa eleitoral estar cumprida!


ÁLVARO MENDONÇA E MOURA

Presidente da CAP